Indústria do açúcar escondeu pesquisa de 50 anos atrás que associava sacarose a doença cardíaca e câncer, revela novo relatório
Pesquisadores da Universidade da Califórnia, em San Francisco (EUA), descobriram dados que revelam que a indústria açucareira escondeu uma pesquisa de 1968 que ligava o açúcar ao câncer.
Os documentos, de acordo com informações do Daily Mail, mostram que a Sugar Association, financiou um experimento chamado Projeto 259, em que avaliava os efeitos da sacarose sobre a saúde cardiovascular. No entanto, enquanto os dados mostravam um vínculo claro, a pesquisa foi abortada. Segundo os pesquisadores, se o artigo tivesse sido publicado à época, teria levado a regulamentação do açúcar pela Food and Drug Administration (FDA).
A pesquisa, que foi financiada e projetada pela indústria açucareira, tinha como objetivo dissipar os receios de que os açúcares como a frutose afetavam os lipídios sanguíneos. Mas, conforme descoberto pelos pesquisadores da Universidade da Califórnia, os líderes da indústria frearam a publicação que seria o link mais claro entre o açúcar e doenças já encontrado.
A descoberta, que foi publicada recentemente na revista PLOS Biology, é a mais recente de uma série de relatórios “bombásticos” da pesquisadora investigativa Dra. Cristin Kearns, e o coautor Dr. Stanton Glantz, que foi o primeiro pesquisador a revelar que a Big Tobacco estava escondendo pesquisas sobre o perigo de cigarros em 1996.
Em entrevista ao Daily Mail Online, os pesquisadores explicaram que se o estudo tivesse sido publicado em 1968, como planejado, teria desencadeado automaticamente uma revisão da sacarose pela FDA dos EUA, o que provavelmente levaria à regulamentação do açúcar.
Contudo, ao invés disso, foram necessárias cinco décadas para a comunidade científica chegar a um acordo relativo de que o açúcar é ruim para a saúde e tem um vínculo direto com câncer e doenças cardíacas. “Quanto mais olhamos, mais percebemos que a indústria açucareira sofreu uma compreensão sofisticada da ciência há décadas, sofisticada o suficiente para manipulá-la”, disse o Dr. Glantz. “Este estudo, se tivesse sido publicado, teria sido bastante decisivo à época. Se o trabalho tivesse avançado, teria criado um debate sobre os triglicerídeos e açúcar há décadas”.
O estudo recente é baseado em uma revisão de documentos arquivados. Ele revela que a Sugar Research Foundation (SRF), agora conhecida como Sugar Association, financiou um experimento chamado Projeto 259 para avaliar os efeitos da sacarose sobre a saúde cardiovascular. Mas, como com muitos trabalhos de pesquisa, foi empatado. Agora, os pesquisadores, foram ao SRF para pedir um novo impulso no financiamento para levar a pesquisa ainda mais longe.
Ainda hoje, a Sugar Association, nega que o açúcar tenha qualquer impacto direto sobre a saúde, além do ganho de peso. No ano passado, a organização criticou um estudo feito com ratos que sugeria uma ligação entre o açúcar e crescimento de tumores, dizendo que “nenhuma ligação credível entre açúcares ingeridos e câncer foi estabelecida“.
No entanto, a Dra. Kearns atesta que conhece pelo menos 300 estudos financiados pela própria indústria do açúcar entre 1943 e 1972. “Existe mais material do que tenho a capacidade de escrever”, disse. “Nós precisaremos de muito mais pesquisadores para descobrir tudo”.
“Este tipo de manipulação de pesquisa é semelhante ao que a indústria do tabaco faz”, acrescentou Dr. Glantz. “Este tipo de comportamento questiona os estudos financiados pela indústria açucareira como uma fonte confiável de informações para elaboração de políticas públicas“.
Em uma análise anterior, feita em conjunto com a Dra. Kearns, Dr. Glantz descobriu que a SRF havia financiado secretamente uma revisão de estudos em 1967, pedindo que fossem minimizadas as evidências que ligavam o consumo de sacarose à doença cardíaca coronária.
“Esta descoberta incidental do Projeto 259 demonstrou à SRF que a sacarose e o consumo de amido causou diferentes efeitos metabólicos, sugerindo que a sacarose, ao estimular a beta-glucuronidase urinária, poderia ter um papel na patogênese (causa) do câncer de bexiga”, explicou o pesquisador. Segundo ele, a SRF então descreveu a descoberta em um documento interno em setembro de 1969 como “uma das primeiras demonstrações de uma diferença biológica entre a sacarose e ratos alimentados com amido“.
No entanto, logo após ter aprendido sobre esses resultados – e pouco antes de o projeto de pesquisa estar completo – o grupo encerrou o financiamento para o projeto e não foram encontradas mais informações sobre o trabalho. Então, ao encerrar o Projeto 259, o papel do açúcar nas doenças cardiovasculares foi minimizado.
“Nosso estudo contribui para uma literatura mais ampla de documentação da manipulação industrial da ciência”, disse Dr. Glantz. “Com base na interpretação dos resultados preliminares da ISRF, o aumento do financiamento do Projeto 259 teria sido desfavorável aos interesses comerciais da indústria açucareira“. Portanto, “o financiamento foi interrompido antes que isso acontecesse”.
Fonte: jornalciencia
Nenhum comentário